sexta-feira, 20 de junho de 2008

Incomunicável


Hoje eu acordei com vontade de dormir de novo.
Todo dia nos dado é dia do novo,
dia de novo encanto,
de cantos antigos em qualquer um dos cantos do meu coração.
Acordei com saudade dos dias de poucos bolos,
de poucas velas,
dos presentes dados com muita pena,
muita penação e muita reza.

Aqueles eram dias eufóricos?
Não.
Eram sim,
máscaras da tristeza,
eram feridas abertas,
cobertas de um sonho esperando a verdade há mais tempo
que minha estação celebrada nas embalagens do hoje.

Hoje eu acordei sabendo que mudar é passar pela dor.
Eu soube que aquele tempo, todo o nada que eu tinha
é realmente nada do que tenho hoje.
Que falta nos faz a inocência,
das verdades nuas e desavergonhadas,
daquele quarto de todos nós,
um castelo em minhas ânsias,
Daquelas flores,
um jardim em meu paladar.

A dor não é a mesma continuamente
e nem para sempre.

Deus é o sempre,
comigo ininterruptamente.

E pra hoje,
colho os restos do passado e com ardor,
devoro as minúcias
pra semear os detalhes,
pois em retalhos,
vou costurando um cobertor de memórias,
e colhendo as histórias
pra eu sempre lembrar de mim
quando debaixo dele eu acordar.

Acordar com ela...

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Cantando para o Sol

As ruas de São Paulo, no fim de um entardecer de sábado, eu afirmo, são atmosferas torturantemente solitárias, portanto, não riam de mim, pois aqui, atrás dos prédios, é raro ver o Sol dormir.

Note que ninguém se importa com o Sol se despedindo do hoje.

Qualquer implicação deste nível é pura perda de tempo quando cabisbaixos caminhamos sabendo onde pisamos e não por onde vamos.

Deus do céu, o Sol sente falta de ser olhado enquanto entra num sentimento intransferível que só o desprezo nos causa.

E de tanta criação só, não é apenas o Sol, astro maior, carregado de luz intensa que sente a carência de alguém que o veja se despedir de nós.

A noite de sábado nem em seu auge estava quando eu, encostado num daqueles botecos de médio porte, pelas sete da noite, na hora da janta e não da festa, onde ao longe se vê banheiros abertos e nas paredes inúmeros azulejos rachados me admiro com alguém tão perto da solidão que nem o Sol em sua beleza ímpar imaginaria passar.

As minhas admirações são adoravelmente seguidas de uma série de espantos e neste bar, cheio de extravagância pessoal, um homem cortejou minha atenção bem mais que uma dona incrivelmente vestida de azul celeste e saia decorada de lantejoula e na boca, um batom de tom púrpuro, mas não tão delineado assim.

O boteco tinha um daqueles músicos talentosos que pra sobreviver, saca das costas um violão e de bar em bar, pede pra apresentar seus dons em troca de um cachê ou se servir da sorte de alguém que ao vê-lo, faça propostas melhores. Uma vez, me disseram que não fazem sucesso por serem feios, por isso, fazem questão de não lapidarem um talento perdido em qualquer endereço fácil de encontrar.

Tanto o Sol no fim de tarde quanto esse músico no intróito da noite não mastigam uma solidão caracterizada pelo isolamento e pelo encarceramento da comunicação e mais, um é só por ser brilhante demais para os nossos olhos fitarem sem alguma proteção e o outro, é feio demais pra você dar cinco minutos da sua vida pra sua voz.

O mundo da solidão não se perde no término de uma relação, mas se encontra quando sem saber, nos deparamos com quem, em algum lugar, seja na ponta do horizonte ou no banco de um boteco, ao lado do banheiro quer cantar pra qualquer um que queria esquentar a pele ou por trás dos prédios abrasar o coração.

Eu lhe disse cantor, sem dizer a você, que lhe escreveria um texto.

Promessa cumprida.